quinta-feira, maio 29, 2014

Wake up.

Às vezes eu consigo ver o tempo. Consigo ver ele escorrendo pelos meus dedos enquanto eu me perco naquilo tudo que não consigo resolver. 
Eu enxergo claramente o rastro que eu deixei no caminho entre o que eu poderia ser e o que eu sou, entre o que eu quero e aquilo que eu efetivamente tenho coragem de ser.
Aí eu choro os litros de amargura, de distância, de tempo, de sapos engolidos, tarefas contraditórias, valores ignorados. Eu engasgo em mim mesma com 16 anos, com 22, com o que diabos eu me tornei agora.

Mas é só hoje. Ou só sempre. Ou só quando eu consigo me enxergar.

domingo, maio 18, 2014

talk is cheap

Há três meses eu voltei de uma viagem e nunca desfiz a mala. Deixei as roupas usadas. O casaco úmido daquela noite gelada. Deixei a segunda via do cartão do restaurante que você pagou, o troco de dois e cinquenta da passagem, o meu melhor vestido que eu levei e não tive chance de usar. Tem pêlo do seu gato, uma folha do pé de jabuticaba do seu quintal, tem um adesivo grudado na sola de uma sapatilha que saiu de um disco novo que você comprou e tava jogado no chão da sala. Há três meses eu voltei de uma viagem e nunca desfiz os nós que você fez no meu cabelo quando me beijou na chuva. Nunca desfiz os nós que minha terapeuta gosta de citar. Há três meses eu voltei de um nó e eu nunca me desfiz.

quarta-feira, maio 07, 2014

Ouro de tolo

Era algo tão simples quanto procurar o amor e não encontrar, mas mesmo assim eu não consegui me perder de você. Não consegui evitar as noites em claro, as brigas, os conselhos infundados, os olhos cheios de lágrimas enquanto tentava fingir um sorriso.

Passei mais tempo do que gostaria perdida entre a escolha óbvia, e certa, e o som tão ridiculamente familiar e confortável do teu gemido no meu ouvido. Embora eu tenha te falado com olhar desafiador que não há jeito de saber qual a escolha certa e você tenha terminado uma longa discussão dizendo que a certeza da auto-preservação não existe, eu ignorei todo o prólogo.

Me peguei sorrindo quando você olhava nervoso para tudo que eu fazia, quando apressava meu passo, questionava meus valores. Eu me apaixonei pelo seu descaso. Me prendi ao pouco, quase nada, de sentimento. Ainda que ele não fosse por mim. Me mantive próxima. Trilhei um caminho. Me apeguei a cada poro, cada gota de suor, à camiseta daquela banda que odeio, às discussões sobre a tarifa do metrô, à pessoa que te abandonou no altar, ao seu pai doente, ao seu aluguel que subiu. Juntei com cuidado todos os seus pedaços. Te construí dos seus próprios restos. Me mantive próxima. Trilhei um caminho. Foi algo tão simples quanto procurar o amor e encontrar o que sobrou dele. Eu nunca consegui me perder de você.