sexta-feira, setembro 21, 2012

A eficácia efêmera do desgosto de Proust.


A gente já saía há algum tempo, pensei que era tudo muito sério, em breve conheceríamos as famílias, deixaríamos roupas pra dormir, almoçaríamos juntos aos domingos. Decidi que era hora de não postergar mais e chegar ao assunto inevitável: meu livro preferido.

Estávamos aconchegados no sofá, eu levantei com alguma cerimônia, fui até meu quarto, peguei o livro. Sentei na frente dele, olhando ele nos olhos.

Com cuidado, botei o livro nas mãos dele. É uma edição econômica de 1986, caindo aos pedaços, com o nome do meu irmão mais velho escrito na folha de rosto e algumas páginas soltas. Coleção grandes sucessos da literatura internacional da Rio Gráfica - Os prazeres e os dias, de Marcel Proust.

Entreguei o exemplar como quem entrega um filhote de gato adoentado. Eu queria que ele se encantasse por aquelas 240 páginas marrons tanto quanto eu. Ele me olhou sorrindo. Pensei que era timidez ou receio, que ele esperava alguma introdução. Fui abrindo as páginas 177, Elogio da música ruim, 176, Eficácia efêmera do desgosto - Olha, esse aqui é foda - 174, Origem das lágrimas que estão nos amores passados. Ele fechou o livro, olhou a contracapa, a capa, mexeu na parte da lombada que tá descolando. Folheou. Uma página solta saiu do lugar.

Ele me olhou e disse: você é a mulher mais incrível que já conheci. Colocou o livro de lado, me beijou. Foi quando olhei pro meu livro preferido em cima do sofá, com uma página solta escapando por debaixo da capa. Me desfiz do abraço, ajeitei a página e levantei sem cerimônia. Fui até meu quarto, guardei o livro, os almoços aos domingos, as roupas pra dormir e os familiares. É um livro de ensaios e de contos muito curtos.

Um comentário:

The Ultimate Nerd disse...

Meu deus!!!