EFICÁCIA EFÊMERA DO DESGOSTO

"Sejamos gratos às pessoas que nos propiciam felicidade, são elas os encantadores jardineiros que nos fazem florir a alma. Sejamos, porém, mais gratos às mulheres más, ou só indiferentes aos amigos cruéis que nos magoaram. Devastaram nosso coração, hoje coberto de cacos irreconhecíveis, arrancaram troncos pela raiz e mutilaram os ramos mais delicados, como um vento atroz, mas que semeou alguns grãos para uma colheita incerta.
Reduzindo a cacos todas nossas pequenas venturas que escondiam nossa grande miséria, fazendo de nosso coração um galpão destelhado e melancólico, permitiram-nos enfim contemplá-lo e julgá-lo. As peças tristes nos fazem um bem semelhante; por isso temos de considerá-las muito superiores às divertidas, que enganam nossa fome ao invés de saciá-la: o pão que deve nos alimentar é acre. Na vida feliz, os destinos de nossos semelhantes não nos aparecem em sua realidade, quer o interesse os disfarce ou o desejo os transfigure. Mas no desapego provocado pelo sofrimento, na vida, e o sentimento da beleza dolorosa, no teatro, os destinos dos outros homens e até o nosso fazem com que nossa alma atenta ouça, por fim, a eterna palavra compreendida de dever e verdade. A obra triste de um artista verdadeiro nos fala com o acento dos que sofreram, forçando todo homem que sofreu a deixar tudo de lado e ouvir.
Infelizmente, o que o sentimento trouxe esse caprichoso o leva de volta e a tristeza mais importante que a alegria não é duradoura como a virtude. Esquecemos esta manhã a tragédia que ontem à noite nos ergueu tão alto que considerávamos nossa vida em conjunto e em sua realidade com sincera e lúcida compaixão. Dentro de um ano, talvez, nos consolaremos pela traição de uma mulher, pela morte de um amigo. O vento, em meio a esses destroços de sonhos, a esses cacos de felicidades mirradas, semeou o bom grão sob um mar de lágrimas, mas elas secarão depressa demais para que ele possa germinar."

[A Convidada - François de Curel (1854 - 1928)]