segunda-feira, julho 15, 2002

Voador

"Ele não era só um zero. Nem que fosse à esquerda. Ele era pior. Era um bosta, um perdido na vida. Fodido e sem dinheiro. Um "negativo". Jurava que me amava e, ao mesmo tempo, pedia que eu não esperasse ser mais importante do que a droga da vida dele. Ele me ligou e disse que eu era "muito linda". Me fez sorrir. E entrou, sem pedir passagem, fazendo o que fosse possível pra passar por mim. E me achou linda. E amou meus silêncios e cantou pra mim e tocou pra mim e se apaixonou por mim. (E viajamos cantando Radiohead, alto, sem nos importar.) Aí eu pedi pra ele me esperar por um segundo. Mas ele não durava um segundo. O amor dele se consumia tão rápido quanto. E ele se apaixonou por outra pessoa. Então ele fez a coisa mais linda: pegou um ônibus junto comigo. Um ônibus cheio, sem lugar pra sentar. E ficamos como ficam os casais de namorados nos ônibus, em pé, um segurando no outro. E ele, fodido e sem dinheiro, inflou meu ego, meu coração e meu estômago. E eu fui querida. E ele notou. Depois do segundo, do ônibus, e do pão de queijo, ele disse que eu sou foda. E terminou comigo. E fumou um na minha casa. Eu, como qualquer pessoa faria, devolvi os presentes dele e gravei uma fita do Travis pra ele. E listei, em 5 páginas, "coisas que me lembram ele".
Na última vez em que o vi, eu estava com uma planta carnívora na mão. E ele disse que eu sou foda. E eu sorri. E isso faz bastante tempo. Voador."

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